Acórdãos de Direito Civil

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05-05-2015

(http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0d5ddc4c0f41c06d80257e3d003c4b3c?OpenDocument)

“I - A inutilidade superveniente da lide supõe a ulterior ocorrência de uma circunstância que retire às partes o interesse em agir, aferido em função da necessidade de tutela judicial, ou que implique a desnecessidade de uma pronúncia judicial, por ausência de efeito útil.

II - Carece de fundamento a pretensão de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, com base na invocação pela parte recorrente de factos novos e supervenientes, relativamente ao momento em que foi proferida a sentença na 1.ª instância, os quais, em rigor, configuram questão nova, de que o STJ não pode conhecer (art. 627.º, n.º 1, do NCPC).

IIII - Não há abuso do direito, na modalidade do desequilíbrio no exercício de posições jurídicas, em especial, do exercício inútil danoso, na reclamação feita à autora pela ré, de realização de obras para poder fruir o espaço locado, não se tendo provado que o fez com intenção maldosa de prejudicar, pelo contrário, que, antes, procurou assegurar a habitabilidade e salubridade desse espaço, onde já sofreu danos materiais e vive em sobressalto pelas más condições do mesmo.

IV - Cai, porém, na previsão desse abuso, na modalidade de desproporcionalidade entre a vantagem auferida pelo titular e o sacrifício imposto pelo exercício a outrem, se, pagando uma renda mensal de € 116, 20, a ré exige da autora a realização de obras no locado, que atingirão, estima-se, um valor, no mínimo, na ordem da centena de milhares de euros, sem possibilidade de recuperação, em tempo útil, do investimento feito, o que excede manifestamente os limites impostos pelos interesses sócio-económicos subjacentes ao direito da ré e, atenta a excessiva desproporção entre o valor das obras e o das rendas, viola o mais elementar princípio de justiça.

V - Se a ré vive, há vários anos, sobressaltada, na sua casa de habitação – sítio privilegiado para o descanso e repouso –, com receio de quedas de estuque dos tectos, sofre dano não patrimonial, cuja gravidade, objectivamente considerada, com reflexos no seu bem-estar físico e psíquico, justifica e impõe a tutela do direito, mediante a fixação equitativa da quantia de € 4000, tal como arbitrado pela Relação.”

 

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 05-05-2015

(http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/d696ce0f68e46e4380257e49005352d9?OpenDocument)

“1. A apresentação de “conclusões”, consistentes na reprodução integral, e ipsis verbis, do alegado no corpo alegações de recurso, dificilmente poderá ser considerada para o efeito do cumprimento do dever de apresentar conclusões.

2. Peticionando os autores a condenação da 1ª ré no pagamento de uma indemnização pelos danos causados no seu apartamento, a condenação solidária de ambas as rés no pagamento de tal indemnização, indo para além do que foi pedido, integra uma nulidade da sentença.

3. O locador financeiro, faltando-lhe o domínio da coisa locada e a consequente obrigação de a vigiar, que é pressuposto da obrigação de indemnizar prevista no citado artigo 493º do CC, não poderá ser responsabilizado pelos danos causados por aquela.”

 

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 05-05-2015

(http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/5b4aaf2de847dee380257e4300388a55?OpenDocument)

“I – É através do disposto na Base XXXVI do regime geral publicado em anexo ao Decreto-Lei nº 294/97, de 24 de Outubro; e nas Bases LIII e LIV anexas ao Decreto-Lei nº 142-A/2001, de 24 de Abril, que a Doutrina, no contexto de eventos atinentes à circulação dos utentes em auto-estradas, fala, referindo-o à concessionária, num “[…] dever de assegurar um padrão elevado na circulação rodoviária” e isola no quadro deste um concreto dever de informação cautelar ao utente dos factores que sejam aptos a condicionar essa circulação moldado (o dever) por esse padrão prestacional e de segurança qualificado, temperado este por aquilo que seja racionalmente possível – só o que é possível é racionalmente exigível a quem quer que seja – esperar de uma estrutura empresarial sobre a qual impende o dever de se organizar para garantir esse padrão.

II - Vale isto por dizer que o grau de exigência à concessionária será – é – considerável, mas que o mesmo não envolve exacerbamentos cautelares que situem a prestação activa de segurança aos utentes da auto-estrada, concretamente na advertência a estes de perigos inesperadamente desencadeados para a circulação, que, sendo tributários de um padrão de conduta exigente, extravasem do que racionalmente é exigível.

III - O ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança de um troço de auto-estrada concessionada cabe à concessionária, o que não é o mesmo quanto à existência de objectos na faixa de rodagem que estejam na origem de acidentes (artigo 12º, nº 1, alínea a) da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho).

IV - Procurando fixar o padrão de diligência exigível a uma concessionária pela especificidade das situações elencadas no nº 1 do artigo 12º da Lei nº 24/2007, observaremos que, nos casos, que acabam por ser os mais comuns na prática dos tribunais, de acidentes em auto-estrada decorrentes da entrada nas vias de animais, acrescem ao dever de vigilância da concessionária sobre a via (à monitorização técnica e humana da própria via), deveres prévios especificamente ligados à estruturação protectiva da via em termos aptos a impedir o acesso de animais a esta e a travessia das faixas por estes.

V - Diversamente, concretamente dentro da facti species da alínea a) do mesmo artigo 12º, nº 1 (acidente causalmente ligado a objectos existentes nas faixas de rodagem que aí possam ter caído), a questão do desempenho probatório pela concessionária (ou seja: o que para esta significa provar um nível de desempenho suficiente das suas obrigações de segurança activa da via) adquire dimensões mais específicas – menos abrangentes que no exemplo dos animais – às quais não é indiferente a ponderação de factores como sejam o momento do conhecimento da existência do obstáculo na via e o lapso de tempo de reacção em função desse conhecimento.

VI - Referimo-nos aqui ao tempo que a concessionária demora a ter conhecimento e a reagir, sendo que para ter conhecimento exige-se que tenha implementado e que execute um sistema de patrulhamento da via ao longo do dia que, a espaços de tempo aceitáveis, lhe permita verificar as condições de circulação ao longo de todo o troço concessionado. Mais do que isto, só se pode exigir que sejam colocados ao longo da via pontos de contacto com a concessionária (SOS) que possibilitem aos utentes adverti-la das situações ocorridas.

VII - É com este sentido que a nossa jurisprudência, sem abandonar um quadro de exigência qualificado à concessionária, mas aferindo-o no domínio do que razoavelmente é possível, entende que “[i]lide a presunção de culpa que sobre si impende no cumprimento das obrigações de segurança a concessionária que procede à fiscalização da via com regularidade, passando pelo mesmo local de duas em duas horas, assim cumprindo o dever de vigilância e actuando com a diligência que lhe era exigida no contrato de concessão”.